sábado, 25 de junho de 2011

Os Sete Pecados da Memória - Sétimo Pecado: Persistência

 Essa postagem de hoje encerra nossa série sobre os Pecados da Memória. James McGaugh, diretor fundador do Centro de Neurobiologia de Aprendizado e Memória, costuma dizer que um dos aspectos mais notáveis da memória é o esquecimento. Esquecer é normal e necessário. Sholem Asch, famoso escritor polonês radicado nos Estados Unidos, costumava dizer que “não é o poder de se lembrar, mas justamente o contrário, o poder de se esquecer, é uma condição necessária para nossa existência”.
Muitas de nossas lembranças nos incomodam, como os medos, humilhações ou perdas. Outras nos prejudicam, como as fobias, estresse pós traumático ou até mesmo transtornos obsessivos compulsivos.

O pecado da persistência se refere à tendência de, involuntariamente, revisitar lembranças que nos incomodam. A lembrança indesejada pode variar desde uma música do Parangolê que não sai da sua cabeça chegando até mesmo a um evento traumático, como um acidente de carro. Nesses casos, quanto mais nos esforçamos para parar de pensar na lembrança intrusiva, mais forte ela aparece em nossa consciência.

Livrando-se dos earworms
(extraído de http://saude.hsw.uol.com.br/musicas-grudam-na-cabeca1.htm)

James Kellaris, professor de marketing da Escola de Administração de Negócios da Universidade de Cincinnati, fez uma pesquisa sobre earworms e coceira cerebral, e descobriu que cerca de 99% das pessos já foram vítimas do fenômeno uma vez ou outra [fonte: BBC News]. Kellaris diz que mulheres, músicos e pessoas neuróticas, cansadas ou estressadas são mais propensos aos ataques dos vermes de ouvido. Com músicos, faz sentido, já que eles escutam música continuamente, mas Kellaris não tem certeza do por que as mulheres serem mais susceptíveis aos earworms.

Pesquisadores também não estão certos sobre por que algumas canções grudam mais que outras, mas todos temos uma música que nos deixa loucos. Frequentemente, as músicas têm uma melodia alegre, simples; letra repetitiva e fácil de lembrar; e uma surpresa, como uma batida extra ou um ritmo incomum - os mesmos fatores que tornam as canções ou jingles populares em primeiro lugar (como o jingle da palha de aço Assolan, baseado no rítmo do música "Festa no apê", do Latino).
A maioria das pessoas (74%) é pega por músicas com letras, mas jingles publicitários (15%) e músicas instrumentais (11%) também podem ser duras de se livrar [fonte: DeNoon]. O que nos faz lamentar é motivo de celebração para gravadoras e publicitários, que são extasiados quando as pessoas não conseguem tirar da cabeça suas músicas ou jingles.
Ao contrário da crença popular, nós não repetimos apenas as músicas que odiamos. Em um estudo feito por pesquisadores da Bucknell University, mais de metade dos estudantes que tinham canções grudadas na cabeça classificaram-nas como agradáveis, e 30% como neutras. Apenas 15% das músicas foram consideradas desagradáveis.
Como tirar uma música da cabeça
Infelizmente não há forma testada e comprovada de tirar uma música-chiclete da cabeça depois que ela está alojada. Elas podem martelar seu cérebro por poucos minutos ou por dias a fio - tempo bastante para deixar qualquer pessoa são batendo pino. A maioria dos earworms vai embora por conta própria, mas se uma canção estiver enchendo o seu saco ao ponto da insanidade, aqui vão umas poucas dicas para tentar:

1. Cante outra canção, ou toque outra melodia ou instrumento. Mude para uma atividade que o mantenha ocupado, como malhar.
2. Ouça a canção inteira (isso funciona para algumas pessoas, principalmente para aquelas que se lembram apenas de parte da música que está grudada).
3. Ligue o rádio ou o CD para que o cérebro sintonize outra canção.
4. Compartilhe a canção com um amigo (mas não se surpreenda se a pessoa virar um ex-amigo quando ele ou ela for embora cantarolando a melodia).
5. Visualize o earworm como uma criatura real de arrastando para fora da sua cabeça,e depois imagine-se pisando nele.

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quarta-feira, 22 de junho de 2011

Os Sete Pecados da Memória - Sexto Pecado: Sugestionabilidade

Imagine que você em um estádio de futebol assistindo a uma final de campeonato. Em seguida, um jogador do time adversário comete uma falta em seu campo de defesa, próximo da área. Você pensa: “Que pena que a falta foi fora da área. Caso contrário, teria sido um pênalti”. Apesar disso, a torcida do seu time começa a gritar: “FOI PÊNALTI!”. Um de seus amigos reclama: “Juiz ladrão! Foi pênalti claríssimo, o jogador estava dentro da área”. Você observa os jogadores do seu time irem em direção ao juiz reclamando do suposto pênalti ocorrido. Em seguida, você recapitula mentalmente a cena em que aconteceu a falta. Ao recapitular mentalmente a cena da falta, você tem certeza: realmente foi pênalti. Apesar de você ter “certeza”, realmente não foi pênalti. Na verdade, você sofreu as conseqüências do pecado da sugestão na memória.
A sugestionabilidade se refere à possibilidade de nossa memória ser influenciada por informações aprendidas após a codificação da lembrança. Em outras palavras: a influência de outras pessoas ou eventos pode alterar nossas memórias, criando até mesmo lembranças de eventos que jamais ocorreram.

No Brasil, um caso de implantação de memórias falsas ficou famoso na mídia: o caso de abuso sexual na Escola Base. Nesse caso, os donos da escola foram acusados injustamente de terem abusado sexualmente de dois alunos da escola. Provavelmente, as crianças evocaram falsas lembranças do abuso, implantadas pelo questionamento de seus pais e da polícia.

Diversos estudos demonstraram como é fácil implantar memórias falsas em nossas lembranças. Em um desses estudos, os pais de estudantes universitários foram questionados sobre a veracidade de alguns eventos da infância da vida de seus filhos. Após assinalarem quais eram os eventos que realmente aconteceram e quais foram inventados pela equipe de pesquisa, os filhos seriam questionados sobre a veracidade dos mesmos eventos. Em uma primeira avaliação, os filhos conseguiram identificar com bastante acurácia quais eram os eventos reais e quais haviam sido inventados pelos pesquisadores. Em uma segunda entrevista, o pesquisador sugeriu que um dos eventos inventados teria realmente ocorrido. Após a sugestão, mais de 30% dos indivíduos evocaram alguma lembrança relacionada ao evento criado pela equipe de pesquisadores.

Yumiura

Em "Yumiura", conto de Yasunari Kawabata, um escritor recebe a visita inesperada de uma mulher que diz tê-lo conhecido há 30 anos. Ela afirma que os dois se encontraram quando ele visitou a cidade de Yumiura, mas o escritor não se lembra dela. Atormentado por outros lapsos recentes de memória, ele interpreta o incidente como mais um sinal do seu declínio mental. Da aflição ele passa ao pânico quando a mulher revela o que aconteceu num dia em que ele foi ao quarto dela. "Você me pediu em casamento", lembra ela, melancólica. O escritor vacila ao refletir sobre a importância daquilo de que se esqueceu. Depois que ela sai, bastante abalado ele procura mapas para localizar Yumiura, na esperança de despertar alguma recordação. Mas nenhum mapa ou livro a cita. O escritor se dá conta então de que ele não poderia ter estado lá naquela época. Apesar de a mulher acreditar em suas memórias, tão detalhadas, emocionadas e precisas, elas eram totalmente falsas.

O conto de Kawabata ilustra como a memória pode causar problemas. Às vezes nós esquecemos o passado outras, nós o distorcemos. Recordações perturbadoras podem nos atormentar por anos. Mas também dependemos da capacidade para realizar um número impressionante de tarefas cotidianas.

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quarta-feira, 15 de junho de 2011

Os Sete Pecados da Memória - Quarto Pecado: Atribuição Equivocada


A atribuição equivocada se refere a um erro na fonte de determinada lembrança específica. Um bom exemplo é aquele que eu disse anteriormente, onde as pessoas me assistiram no Caldeirão do Huck, mas achavam ter me visto no Faustão. Vamos a um outro exemplo de atribuição equivocada. Suponha que seu amigo lhe pediu um livro emprestado. “Eu vi o livro na estante do meu quarto. Espere que vou buscá-lo”.

No entanto, você não encontra o livro. “Estranho, tenho certeza que o vi aqui”, você lamenta. No dia seguinte, você encontra o mesmo livro na estante do seu escritório. Nesse exemplo, o fenômeno da atribuição equivocada fez com que você confundisse o local onde você avistou o livro.

Outro tipo de atribuição equivocada ocorre quando nos convencemos de que uma idéia que tivemos é totalmente original, mas na verdade, é de algo que vimos ou ouvimos anteriormente. Essa é a explicação pra muito plágio não intencional, em que você escreve algo que você julga ser uma criação sua, mas é baseado em algo que você leu anteriormente.

Yesterday

Um caso interessante que ilustra nossa dificuldade em identificar as fontes de nossa memória foi o processo de criação da música Yesterday, composta pelo Beatle Paul McCartney.
Um dia, Paul McCartney acordou com a melodia da música Yesterday em sua mente. Essa melodia estava acompanhada por uma letra bastante inusitada:

Scrambled Eggs
Oh my darling you've got lovely legs

A letra e sua melodia estavam tão claras na mente de Paul McCartney que ele tinha certeza: “Já ouvi essa música em algum lugar”. Em seguida, McCartney fez uma busca pela música “Scrambled Eggs”. Mais de um mês depois da criação da música e após conversar com diversos críticos de música e produtores, McCartney descobriu: a música realmente era original.
Assim, McCartney passou a desenvolver a letra da música que se tornaria um dos maiores sucessos da música pop de todos os tempos.

Estratégias para lidar com o problema

Veja logo abaixo algumas estratégias para evitar esse problema:

• Ao se deparar com alguma lembrança com origem duvidosa, procure se perguntar: “Quem lhe contou isso”,”Onde você viu ou ouviu isso pela primeira vez”, “Onde você acha que você adquiriu essa lembrança”, “Com quem você estava no dia em que você adquiriu essa memória”, “O que você estava fazendo quando se deparou com essa informação?”, “Por que você estava nesse lugar, nessa situação, com essa pessoa?”, dentre outras. Essas perguntas procuram identificar detalhes específicos da sua lembrança, diminuindo as chances de interferência na origem de sua fonte.

• Não tire conclusões precipitadas. Lembra-se do exemplo que dei sobre minha participação no Caldeirão do Huck? Provavelmente, essas pessoas pensaram: “Eu assisti a apresentação do Alberto em um final de semana, deve ter sido no Faustão”. Ao evitar as conclusões precipitadas, você diminui as chances de cometer o Pecado da Atribuição Equivocada.

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terça-feira, 14 de junho de 2011

Os Sete Pecados da Memória - Terceiro Pecado: Bloqueio da Memória


Todo mundo sabe o que é o bloqueio da memória. O bloqueio da memória acontece da seguinte maneira: alguém lhe faz uma pergunta e você têm a impressão de que ela está na ponta da língua – ou seja, você sabe a resposta, mas não consegue evocá-la com precisão. Muitas vezes, você é capaz de dizer todas as propriedades da palavra que está procurando: a letra que ela se inicia, o idioma, palavras que rimam ou até mesmo o número de sílabas da palavra esquecida. No entanto, algo bloqueia a evocação dessa palavra.

Apesar de ser uma experiência incômoda, ela não acontece devido à transitoriedade ou distração. Pelo contrário, essa lembrança está muito bem codificada em nosso cérebro. No entanto, apesar disso, existe algo que nos impede de acessá-la com precisão.

Durante o bloqueio, uma outra informação invade o espaço da informação procurada, impossibilitando sua recuperação.

Por exemplo, suponha que você deseja lembrar-se do nome do filme “A ilha do medo”, protagonizado pelo ator Leonardo DiCaprio. Você consegue resgatar a história completa do filme, lembra-se que o outro ator se chama Mark Ruffalo, lembra-se que o número do paciente desaparecido no manicômio é o 67, lembra-se até mesmo do final surpreendente do filme (não, não vou contar!!), mas não é capaz de lembrar-se do nome: “A ilha do medo”. Ao tentar evocar o nome correto, um outro nome surge em sua mente: “A Origem”, outro filme estrelado por DiCaprio. Você pensa: “Oras, mas ‘A Origem’ é um outro filme, não é o filme que procuro.” Apesar disso, quanto mais você tenta se esquivar da resposta errada (“A Origem”), mais forte ela fica em sua consciência.

Um outro exemplo de bloqueio é quando você chama um de seus filhos pelo nome de outro. Em seguida, percebe o erro, mas não consegue consertá-lo. Ou seja, você aparentemente se esquece do nome de um de seus filhos. Ao contrário do que se possa imaginar, esse erro ocasional não é um indício de Alzheimer: você pode simplesmente ter sido vítima do bloqueio de memória. Nesse caso, o nome de um de seus filhos bloqueou a evocação do outro nome que supostamente foi esquecido.

Costumo comparar a memória com um ursinho tímido que você encontra em uma floresta. Ao encontrá-lo, você deseja dar-lhe um abraço. O ursinho percebe sua presença, mas permanece imóvel. No entanto, ao sentir o leve toque de seus dedos, o ursinho sai em disparada, dirigindo-se para uma caverna. Decidido a encontrar o ursinho, você sai em busca dele. Passado algum tempo de busca dentro da caverna, você desiste de encontrá-lo. “Jamais vou encontrá-lo novamente”, você pensa. Decidido a fazer alguma atividade diferente, você decide pescar. Após preparar todo o seu material de pesca, você se dirige ao lago. Ao chegar ao lago, você se assenta e começa a esperar pela mordida dos peixes. Enquanto você está entretido com essa nova atividade, alguém lhe cutuca pelas costas: o ursinho. Espontaneamente, ele lhe dá um forte abraço.

Essa historinha pode parecer boba ou até mesmo infantil, mas retrata fielmente o comportamento de nossas memórias durante algum tipo de bloqueio. Durante o bloqueio, a evocação parece ser iminente: falta pouco para conseguirmos nos lembrar daquilo que desejamos. No entanto, a lembrança simplesmente não surge em nossas mentes. Além disso, a nossa memória tem um caráter sádico: quanto mais insistimos, menos conseguimos nos lembrar. A lembrança costuma surgir apenas depois que desistimos. 

Ainda me lembro de uma vez em que fui vítima de um bloqueio de memória. Estava fazendo um show de memória em um grande evento de uma empresa. Um de meus números mais famosos (e aguardados) é o da memorização da revista: pego uma revista que foi lançada no mesmo dia da minha apresentação e memorizo-a na íntegra. Em seguida, digo o conteúdo mais relevante de cada página da revista: textos, placas de carros e até mesmo a cor da roupa das pessoas nas fotos são descritas detalhadamente. Nesse fatídico dia me questionaram sobre uma das 200 páginas da revista Veja mais recente: “O que existe na página 139?”. Nesse momento, fui acometido de um bloqueio: eu me lembrava que era uma propaganda de carro. Oras, mas que carro? Caso dissesse apenas: “É uma propaganda de um carro” a platéia questionaria sobre outros detalhes da página e eu não saberia. Por ter experiência em meu relacionamento com minha memória, decidi não insistir: sabia que a situação apenas pioraria se eu fizesse isso. Tive uma idéia: relatar todo o conteúdo da página anterior: a 138. Disse para a platéia: “Amigos, a reportagem da página 138 é bem interessante e eu a descreverei antes de dizer o conteúdo da página 139”. Como a platéia já estava visualizando as duas páginas simultaneamente, a platéia não questionou. A página 138 continha muito conteúdo e eu teria tempo para que meu cérebro conseguisse resgatar a informação da página 139 – ao menos, era o que eu esperava. Ignorei meus problemas em relação a página 139 e fui descrevendo a página 138. Enquanto fazia minha descrição, surge na minha mente uma Mitsubishi Pajero prata, modelo TR4 2007, com nova frente com conjunto óptico, novas rodas em liga leve 16'', nova padronagem nos bancos, tração 4x4 super select na “promoção” por R$ 73.990,00 o cambio manual e “R$ 78.990” o cambio automático surgiu em minha mente. “Ufa, pensei enquanto descrevia o conteúdo da página 138.” A idéia deu certo. Ao final da descrição da página 138, pude calmamente descrever o anúncio da referida página sem que a platéia sequer percebesse os apuros por que passei. 

Bloqueios também acometem os estudantes. Quem nunca passou pela situação de conseguir evocar todos os detalhes sobre algum determinado tópico, menos o que está sendo argüido? Nessas situações, a melhor solução é mudar o foco de sua atenção, evitando insistir na recuperação da informação. Suponha que você teve um branco referente a alguma fórmula de análise combinatória. Caso seja uma prova de concurso publico ou vestibular, mude completamente de assunto: vá resolver a prova de português, direito constitucional ou até mesmo informática. Ao mudar completamente de assunto, aumentam as chances de essa lembrança surgir espontaneamente em sua mente. Caso você esteja realizando uma prova que tenha apenas questões da mesma matéria, matemática nesse caso, procure resolver as outras questões da prova, deixando a questão problemática por último.

Em minha experiência pessoal (jamais vi artigos científicos sobre isso), tenho a impressão de que buscas feitas em nossa memória não se interrompem com o desvio de nossa atenção. Por exemplo, suponha que você seja um nerd (como eu) e está almoçando com algum de seus amigos nerds. Em meio a computadores, mangás e videogames, surge uma dúvida: qual o nome da espécie alienígena do personagem “Jar Jar Binks”, presente apenas na trilogia mais recente de “Guerra nas Estrelas” – “Star Wars”?

“Ele nasceu no planeta Naboo! Mas sua espécie não se chama Naboo! Ele também não é um Wookiee! Essa é a espécie do Chewbacca!”, seu amigo fala.
“Tenho certeza absoluta que é um nome curto e que começa com G”, você diz.
“Não, não é Wookiee!!!!”, diz seu amigo desesperadamente.
Após uns dez minutos, vocês desistem e passam a conversar sobre algoritmos para a resolução do cubo mágico (Cubo de Rubik).

Seu dia se passa normalmente, como se você não desejasse mais saber a espécie do detestado personagem Jar Jar Binks. À noite, enquanto você está fritando um ovo, a resposta surge espontaneamente em sua mente “Gungan! Jar Jar Binks é um Gungan”.
Ainda que você não seja um aficcionado sobre Guerra nas Estrelas, esse episódio fictício ilustra o mecanismo de busca e bloqueio da memória. Ainda que você estivesse fritando um ovo, a resposta foi evocada com precisão, com o mínimo de esforço.

Assim, ao se acometer do Pecado do Bloqueio, evite insistir. Com sorte, essa memória será resgatada posteriormente, quando a ansiedade e as lembranças intrusivas cessarem.

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sexta-feira, 10 de junho de 2011

Os Sete Pecados da Memória - Segundo Pecado: Distração


Provavelmente você já cometeu esse pecado diversas vezes: as chaves do carro, o pagamento de uma conta ou até mesmo o motivo pelo qual você abriu a geladeira. Ao contrário do que se pode imaginar, a distração não é uma falha na memória propriamente dita. Na verdade, a distração se refere a eventos que não podem ser evocados pelo simples motivo de nunca terem sido registrados.
A distração está diretamente ligada a nossa atenção e geralmente acontece por dois motivos:

• Quando estamos realizando mais de uma tarefa simultaneamente e acabamos por não prestar atenção em alguma delas.
• Estamos realizando alguma tarefa e alguma coisa/alguém acaba por roubar nossa atenção.

Por exemplo, suponha que você tenha se esquecido onde estejam suas chaves. Provavelmente, você chegou em casa do trabalho cansado e acabou não prestando atenção no local em que as chaves foram abandonadas. 


Observe que o pecado da distração é completamente diferente do pecado da transitoriedade. Vamos a um exemplo: Alberto Einstein, o famoso físico, uma vez esqueceu um cheque vultoso dentro de um livro. Nesse caso, não foi uma distração: afinal, ele conscientemente abriu o livro e pensou: “Dentro desse livro, o cheque estará seguro”. O cheque ficou realmente em um local muito seguro – nem mesmo seu dono conseguiu resgatá-lo! Nesse caso, Einstein foi vítima da transitoriedade – o tempo acabou por desgastar essa lembrança e não da distração (como muitos costumam dizer).

Uma vez, cheguei a ir de carro para a faculdade e voltei de ônibus. Nesse caso, fica claro o fenômeno da distração – ir de carro para a faculdade não era algo freqüente quando eu tinha meus vinte e poucos anos. Aliás, caso eu fosse de carro diariamente para a UFMG, provavelmente eu jamais me esqueceria disso. Ainda me lembro da situação em que me esqueci do meu carro: havia acabado de fazer uma prova dificílima de Equações Diferenciais e ouvi um amigo dizer: “vamos rápido Alberto, o ônibus já está saindo”. Nem tive tempo para pensar, simplesmente entrei no ônibus – algo que eu já fazia diariamente. O engraçado dessa história é que só fui perceber que havia esquecido o carro ao me deparar com a ausência do carro na garagem. Ainda que essa história possa ser engraçada hoje, o fenômeno da distração pode trazer terríveis conseqüências.

Existem algumas estratégias para se evitar o pecado da distração:

• Criar vínculos com hábitos diários.
• Usar estratégias externas.
• Evitar ao máximo a multi-tarefa.
• Exercitar sua habilidade em concentrar-se.

Criando vínculos com hábitos diários

É muito comum que pessoas com a memória saudável se esqueçam de tomar algum medicamento. Geralmente, esses lapsos ocorrem porque tal medicamento é tomado apenas esporadicamente. Por exemplo, suponha que você toma diariamente, algum tipo de remédio controlado. Nesse caso, por ser um hábito repetido por anos e anos, ele dificilmente será esquecido.

Em contrapartida, imagine que você fez recentemente alguma cirurgia e precisará tomar algum remédio, diariamente, pelos próximos dez dias. Grandes são as chances de, nos primeiros dias, o pecado da transitoriedade ou da distração ocorrerem.
Uma boa estratégia para evitar esses pequenos esquecimentos é estabelecer alguma associação entre o remédio e algum hábito diário ou necessidade fisiológica.
Por exemplo, suponha que você precise tomar um remédio a cada 12 horas. Nesse caso, você pode criar a seguinte associação: “Tomarei o remédio logo após o café e pouco antes de me deitar para dormir”. Idosos com déficits graves de memória também costumam lembrar-se melhor de seus remédios quando eles estão associados a alguma das suas atividades diárias (principalmente as refeições).

Quando eu não ainda era campeão e recordista de memória, eu tinha sérios problemas em encontrar três coisas: minha carteira, meu celular e minhas chaves. Desse modo, todos os dias aconteciam o mesmo estresse: perdia vários minutos buscando cada um deles. Atualmente, utilizo uma estratégia muito simples: elegi a mesa da sala da minha casa como o meu “móvel das recordações”. Ao chegar em casa, deixo meu celular, minha agenda, minha carteira e minhas chaves sobre essa mesa.

Há alguns anos, outra distração sempre me incomodava: eu dificilmente encontrava meu carro no estacionamento do shopping. Uma vez, cheguei a ir ao cinema por ter desistido de achar meu carro (afinal, ao fim do filme às 23:00, eu facilmente encontraria meu carro). Nesse caso, bastaria criar o hábito de utilizar alguns dos métodos que utilizo hoje para memorizar o número da vaga em que estacionei (ao longo do livro, você aprenderá meu sistema para memorização de números).
Assim, procure incorporar ao seu dia a dia todos seus afazeres diários.

Estratégias externas de memorização

As estratégias externas dizem respeito à inserção de códigos de memória no próprio ambiente. Um exemplo desse tipo de estratégia é, na véspera de levar alguns documentos importantes para alguém, deixar os mesmos sobre a mesa. No dia seguinte, ao avistá-los, eles serão capazes de evocar a importância de levá-los consigo.
Em contrapartida, as estratégias internas dizem respeito à criação de uma codificação mais adequada da informação, como os processos mnemônicos por exemplo.
Quando tratamos da lembrança de eventos futuros (tomar medicamentos, retirar algo do forno, ligar para alguém em seu aniversário...) o melhor é utilizarmos alguma estratégia externa. Existe um provérbio chinês que diz: “a tinta mais fraca é melhor que a melhor memória”. Eles estão corretos: lembrar-se de eventos futuros é uma das tarefas das mais difíceis. O motivo é simples: a lembrança depende de algum gatilho de memória, algo que a dispare. Ao se tratar de eventos futuros, esse gatilho simplesmente não existe. Além disso, eventos futuros são os melhores candidatos ao pecado da transitoriedade.

Compre e crie o hábito de utilizar uma agenda. Aliás, o simples fato de você anotar alguma informação já aumenta as chances da lembrança. Costumo ouvir diariamente relatos de pacientes/alunos que anotam seus compromissos na agenda todos os dias, mas sequer precisam consultá-la posteriormente. Ao anotar, você cria mais uma codificação para a memória, diminuindo os riscos do Pecado da Transitoriedade.
Se você for adepto de tecnologias, use e abuse das funções do seu PDA, notebook ou smartphone. Tais aparelhos possuem todas as funções necessárias para que você não se esqueça de seus compromissos.

NOTA IMPORTANTE: jamais confie apenas nesses aparelhos eletrônicos. Sua agenda de papel jamais perderá sua bateria, firmware ou qualquer outro desastre a que os equipamentos eletrônicos estão sujeitos!

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quinta-feira, 9 de junho de 2011

Os Sete Pecados da Memória - Primeiro Pecado: Transitoriedade


• Você era o melhor aluno da sua classe em matemática. No entanto, passados 30 anos, você não é capaz de resolver uma simples equação de segundo grau.
• Você leu o jornal hoje pela manhã, mas não é capaz de se lembrar das suas manchetes.
• Você participou de um congresso há 3 meses. Apesar de você ter achado o congresso incrível e tenha adorado todas as palestras, hoje você não é capaz de evocar o nome de nenhum dos palestrantes.
• Na semana passada você teve uma aula sensacional no cursinho. No entanto, hoje você não é capaz de se lembrar de nada dessa aula.
Estes são exemplos da transitoriedade, a tendência que nossas memórias têm de se enfraquecerem ao longo do tempo.

Memórias que você evoca com frequência podem permanecer razoavelmente vívidas por décadas. Por outro lado, outras lembranças desaparecem rapidamente de nossas memórias. O momento em que estamos mais propensos a nos esquecer é logo após adquirir a informação. Essa transitoriedade da memória foi descrita pela primeira vez pelo psicólogo Hermann Ebbinghaus. Em seus experimentos, Ebbinghaus criou várias listas de sílabas sem sentido e observou o tempo necessário para armazená-las. Baseando-se nesse estudo, foi criada a famosa curva de Ebbinghaus – também conhecida como Curva do Esquecimento.


Memória – use-a ou perca-a

A memória requer repetições para o armazenamento das informações. Ou seja, você será capaz de se lembrar das informações que você usa ou pensa frequentemente. Por esse motivo, as lembranças de um livro se tornarão mais fortes se você fizer um fichamento sobre ele ou participar de discussões, do que se você simplesmente abandoná-lo na estante após a leitura.

Imagine dois estudantes pra concursos: um advogado, que trabalha 8 horas diariamente e outro estudante, também formado em Direito, mas que se dedica apenas aos estudos. Dependendo da prova que forem prestar, o primeiro advogado, ainda que com menos tempo pra estudar, pode obter um resultado infinitvamente maior, se ele for argüido sobre situações que ele encontra diariamente. A vivência é capaz de oferecer uma aprendizagem que dificilmente é superada pelo estudo tradicional.
Assim, se você for estudante, procure vivenciar ao máximo aquilo que você está aprendendo – ainda que apenas em sua imaginação.

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terça-feira, 7 de junho de 2011

01 - Sete Pecados da Memória - Introdução

(Gostou? Deixe seu comentário para que eu saiba se os textos estão agradando vocês - ou não)
 
Ao contrário do que se imagina, nossa memória é extremamente frágil. Ainda que sejamos capazes de memorizar milhares de fatos, números de telefone ou até mesmo cartas de baralho, nossa memória por muitas vezes trai nossa confiança. Uma vez, um paciente com cerca de 50 anos me abordou dizendo que estava extremamente preocupado com sua memória. “Estou muito preocupado com minha memória. Frequentemente esqueço onde coloquei minhas chaves, minha carteira ou até mesmo meus remédios”.



Esse paciente encontrava-se aparentemente saudável e articulava-se muito bem oralmente. Pensei: “não me parece ser um candidato a ter sérios problemas de memória. De qualquer forma, realizamos uma bateria de testes com esse paciente e acabamos por descobrir seu problema: desorganização. Assim, bastou que ele criasse alguns bons hábitos para que seus problemas de memória desaparecessem.

Outra vez, uma jovem paciente relatou: “Um dia desses, após realizar compras no super-mercado, senti a falta da minha carteira. Fui roubada, pensei. Antes de desempacotar as compras, me dirigi ao posto policial para fazer um boletim de ocorrência. Após quase 2 horas, chego em casa. Ao desempacotar as compras, encontro minha carteira dentro de uma das sacolas de plástico”. Ainda que esse lapso de memória tenha causado certo transtorno, ele é exemplo de que a distração e os lapsos de memória são parte da condição humana.

Minha apresentação no programa “Domingão do Faustão” ocorreu apenas em 2008. Apesar disso, recebi dezenas de E-mails entre 2006 e 2007 me congratulando pela minha participação nesse programa. Esse é um caso que chamo de “atribuição equivocada” durante o processo de memorização. Nesse caso, essas pessoas me assistiram em algum outro programa de TV, mas acabaram por atribuir essa memória a um outro evento, que ainda não tinha acontecido.

Assim, esses pequenos lapsos de memória ocasionais são comuns a todas as idades. Sim, até mesmo crianças estão sujeitos a eles. Em meus workshops de memória, costumo brincar dizendo que o esquecimento muda de nome com o passar do tempo. Por exemplo, suponha que um adolescente deveria para uma conta para seu pai e acaba se esquecendo. Nesse caso, o esquecimento passa a ter os seguintes nomes: “irresponsabilidade”, “excesso de dever de casa”, “namorada” ou até mesmo “vestibular”. Em contrapartida, se um adulto com cerca de 30 anos se esquece de pagar uma conta, o esquecimento tem outros nomes: “estresse”, “filhos”, “trabalho”, dentre outros. No entanto, se um adulto com mais de 50 anos se esquece de pagar uma conta, o esquecimento passa a ter apenas nome: “velhice”.

Veja bem: não estou dizendo que nossa memória não piore com o passar do tempo. No entanto, a maior parte das críticas de adultos e idosos em relação a sua própria memória são decorrentes maus hábitos de memória, não sendo consequencia do passar do tempo.

Em seu livro Os Sete Pecados da Memória (2001), Daniel Schacter, professor de psicologia na Universidade de Harvard, analisa os tipos de lapsos de memória mais comuns e denomina-os de “pecados” da memória. Tais “pecados” afetam todos nós e não apenas pacientes com graves limitações de memória. Os sete pecados seriam:


  • Transitoriedade, referente ao enfraquecimento da memória com o passar do tempo.
  • Distração, que ocorre quando a nossa desatenção durante a memorização.
  • Bloqueio, situação em que a existência de memórias indesejadas que bloqueiam a informação a ser evocada.
  • Atribuição equivocada, onde ocorre uma mistura entre o evento a ser evocado e outros eventos (reais ou não).

  • Viés pessoal, onde editamos nossas memórias de acordo com nossas experiências e valores pessoais.

  • Sugestionabilidade, referente a memórias falsas implantadas em nossas mentes, decorrentes de perguntas, sugestões ou comentários durante interrogatórios.

  • Persistência, em que não conseguimos nos livrar das memórias indesejáveis.

Os pecados da transitoriedade, bloqueio e atribuição são chamados de pecados de omissão. Ou seja, nós falhamos ao tentar evocar algum fato, dado ou evento. Em contrapartida, os outros quatro pecados são erros de comissão. Ou seja, alguma forma da lembrança está presente, mas está incorreta ou é indesejável. A seguir, aprenda um pouco mais sobre cada um dos pecados da memória. (continua...)

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